Se as palavras têm poder, as letras também
Não prestamos atenção ao desenho das letras à nossa volta, mas experimente escrever um relatório importante ao seu chefe em Comic Sans e você vai perceber que o desenho das letras, subitamente, ganhou importância.
Sou suspeito em falar, pois desenhar letras é o meu trabalho. Fontes digitais, no computador. Não fontes tipo chafarizes. Alguém desenhou cada uma destas letras, acentos e pontuação que você lê agora. E mesmo no caso da brincalhona Comic Sans, acredite, pois já trabalhei ao lado do seu criador, este é um trabalho muito sério.
As letras dão forma visual à linguagem falada. É verdade que não prestamos atenção ao desenho delas enquanto estamos lendo, pois o processo de leitura é automático – passada a fase de alfabetização, nosso foco não está mais no esforço de juntar letras, sílabas e palavras, mas sim, no conteúdo da mensagem em si. Mas isso não quer dizer que elas não influenciam nossa percepção do que está sendo lido. Se você já recebeu um WhatsApp apenas com letras maiúsculas e estranhou a pessoa estar gritando com você, entende o que quero dizer. Se as palavras tem poder, as letras também têm.
As palavras do Piangers têm poder. Elas já mudaram vidas. Não é exagero, enquanto fazíamos este livro, ele me enviou páginas e páginas de histórias de pessoas que lhe escreveram para contar como suas palavras as ajudaram a se reconectar com os filhos, a aliviar a dor numa cama de hospital, a perdoar uma ausência imperdoável, a lhes dar coragem para seguir vivendo, ao invés do contrário.
Já desenhei letras que foram vistas por bilhões de pessoas, mas este é o projeto mais importante da minha carreira. Importância é relativo e individual, mas acho que não tem relação com alcance, ou em ter uma marca multinacional no portfólio, é importante porque é o que realmente importa. Eternizar em livro a mensagem "O Poder do Eu Te Amo”, do Marcos Piangers, irá mudar outras tantas vidas mais.
Um dos meus ídolos é David Carson, sociólogo e surfista que abalou os alicerces do design tradicional na década de 90. Ele forçava os leitores a decifrar (ou abandonar) suas peças gráficas praticamente ilegíveis. Sempre vi suas páginas como convites para a descoberta, da mensagem e das camadas de significados que a reforçavam. O equivalente tipográfico das capas de Sandman, pelo Dave McKean (outro ídolo meu, aliás).
No projeto deste livro, não bastaria que as palavras fossem legíveis e cristalinas. Elas precisavam ganhar vida, não convidar, mas puxar o leitor a descobrir, página a página, a sua própria força através da mensagem do Piangers. Que aliás, aproveitando, se ainda não ficou claro, é meu ídolo. Não o conhece ainda? Recomendo este livro. Tem letras lindas, não que sejam importantes.
Fabio Haag, designer do livro O Poder do Eu Te Amo, de Marcos Piangers.